Globalização e Crise do Emprego: Mistificações e Perspectivas da Formação Técnico-Profissional
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* Gaudêncio Frigotto. Globalização e crise do emprego: mistificações e perspectivas da formação técnico-profissional. Analisa a formação técnico-profissional num contexto de final de século marcado por transformações contraditórias. A disputa pela organização e projeto político-pedagógico da formação técnico-profissional no Brasil nos anos 90 resulta de um embate que confronta um projeto societário que se assenta no ajuste à nova (des)ordem mundial e outro que busca viabilizar uma alternativa autônoma e sustentável de desenvolvimento. No primeiro caso, a formação profissional se desenvolve numa perspectiva pragmática vinculada à ideologia da empregabilidade. No segundo caso, articula-se à educação básica associada à perspectiva da formação de sujeitos e protagonistas de uma cidadania ativa.
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O debate sobre a formação técnico-profissional tem sido intenso e controverso desde os anos 30. A criação dos Sistemas Nacionais de Formação Profissional e do Sistema de Escolas Técnicas Federais, nos anos 40, são de certa forma, resultado desse debate. Tratava-se de um contexto de busca de afirmação de um país que tem como telos a industrialização.1 Quarenta anos depois, década de 1980, no período constituinte e posteriormente, na elaboração da nova LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação), o tema da formação técnico-profissional novamente foi debatido intensa e controversamente. Aprovada a nova LDB, o debate não se esgotou, pelo contrário, se tornou mais complexa e está repleto de mistificações e armadilhas. Com efeito, a LDB aprovada, de caráter minimalista como a define Saviani,2 resultou de um projeto que correu paralelo à longa e intensa negociação efetivada por mais de 30 instituições da sociedade civil, e expressa, na sua essência, o enquadramento da educação fundamental, média e superior, e da formação técnico-profissional ao ajuste mais amplo da sociedade brasileira à nova (des)ordem mundial.
Por tratar-se de uma prática social constituída e constituinte de relações sociais, a formação técnico-profissional está, na sua organização, natureza institucional, financiamento e concepção político-pedagógica, imbricada na crise societária deste final de século. Esta crise é, ao mesmo tempo, sócio-econômica, teórica e ético-política. No âmbito sócio-econômico a crise se explicita pela desordem dos mercados mundiais, hegemonia do capital especulativo, monopólio da ciência e da técnica, desemprego estrutural e maximização da exclusão. No plano teórico, a crise se revela na incapacidade de referenciais de análise darem conta dos desafios do presente. Por fim, a crise ético-política, que se manifesta pela naturalização da exclusão, da violência e da miséria humana.
Nessas circunstâncias, tanto no plano societário mais amplo quanto em políticas específicas como é o caso da formação técnico-profissional, o risco é o surgimento de atitudes e medidas oportunistas, simplificadoras, ou de soluções mórbidas. A todo instante ouvimos falar que estamos em tempo de reestruturação produtiva de economia competitiva e de globalização. E, em face dessa realidade posta como "irreversível", a escola e as instituições de formação técnico-profissional necessitam ajustar-se. Esse ajuste postula uma educação e formação profissional que gere um "novo trabalhador"- flexível, polivalente e moldado para a competitividade. Cabe à escola e aos centros de formação profissional, nessa perspectiva, desenvolver um "banco" variado de competências e de habilidades gerais, específicas e de gestão. Diante das mudanças no mundo do trabalho, mormente da crise estrutural do emprego, já não se pensa em "formar para o posto de trabalho", mas formar para a "empregabilidade".
A análise que empreendemos neste breve artigo, não compartilha do ideário do ajuste e, por isso, objetiva interrogar os rumos dominantes que o governo e parte dos empresários, em nome do mesmo, direcionam a formação técnico-profissional. Mais que um horizonte democrático, desenha-se um processo de elitização, de reducionismo político-pedagógico e um terreno forte de mistificação e alienação.
Para apreender o contexto mais complexo em que se situa a formação técnico-profissional, neste artigo, vamos abordar quatro pontos. Primeiramente, de forma introdutória, sublinharemos que a globalização não é um fenômeno novo. Nova é sua escala, natureza e velocidade, e sua capacidade paradoxal de excluir e fragmentar. Por isso, tal como vem sendo veiculada constitui-se em mais uma poderosa ideologia do que em um conceito que nos ajude a compreender melhor a realidade. O segundo ponto busca caracterizar a construção da sociedade do trabalho-emprego ou sociedade salarial,3 como estratégia de inserção e coesão social. Nesse âmbito situam-se políticas de intervenção do Estado como forma de regulação social, algo impensável no capitalismo até os anos 30. É nessa estratégia que, nos anos 40, surgem no Brasil instituições de direito privado, mas com aportes do fundo público– como o Serviço de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço de Aprendizagem Comercial (Senac) – cuja função precípua era de oferecer formação-profissional em grande escala. No terceiro item procuraremos assinalar o processo de desmonte da sociedade salarial como resultado da "vingança do capital contra o trabalho" mediante as políticas neoliberais associadas ao monopólio da tecnologia, desregulação do capital e globalização excludente. Destacaremos, também, os cenários que se apresentam como conseqüência desse desmonte. Esses três primeiros itens nos permitem situar, no quarto ponto, a formação técnico profissional. No horizonte do ajuste ela assume o papel de política focalizada de inserção ou reinserção dos desempregados ou construtora de uma "carteira" ou "banco" de competências para a "empregabilidade, trabalhabilidade ou laborabilidade".4 Finalmente, nas considerações finais, assinalaremos alguns aspectos relacionados a um projeto societário alternativo de desenvolvimento e a função da escola básica e formação técnico-profissional. Questionaremos a tese de setores do governo e empresários que, em nome do chamado custo Brasil, afirmam a necessidade de reduzir os impostos e acabar com o recolhimento compulsório para a formação profissional. Realçaremos as implicações institucionais e as conseqüências sociais dessa perspectiva.
A globalização de final de século ou uma sociedade 20 por 80?
O processo de globalização (5) não é um fenômeno novo e, também, não é algo negativo em si mesmo. A positividade ou negatividade dos processos de globalização são definidos pelas relações sociais. Romper as barreiras das cavernas, dos guetos e da província tem sido uma busca constante na construção histórica do ser humano. Sua negatividade reside na forma de relações sociais até hoje vigentes – relações de classe – que tipificam, na expressão de Marx, a pré-história do gênero humano.
Sem dúvida, foi a revolução burguesa que acelerou exponencialmente o processo de globalização, mormente das mercadorias. Os pensadores que formularam o pensamento clássico da economia, Adam Smith e Marx, cada um dentro de sua perspectiva analítica, mostram que a sociedade capitalista impulsiona as mercadorias para mercados os mais distantes. Num dos mais divulgados e discutidos textos escritos por Marx e Engels, o Manifesto Comunista, que completou 150 anos em março de 1998, a positividade e negatividade da globalização é descrita de forma emblemática.
Onde quer que tenha assumido o poder, a burguesia pôs fim a todas as relações feudais, patriarcais e idílicas. (...) A burguesia não pode existir sem revolucionar constantemente os meios de produção e, por conseguinte, as relações de produção e, com elas, as relações sociais. (...)
A revolução contínua da produção, o abalo constante de todas as condições sociais, a eterna agitação e incerteza distinguem a época burguesa de todas as precedentes. Suprimiram-se todas as relações fixas, cristalizadas, com seu cortejo de preconceitos e idéias antigas e veneradas; todas as novas relações se tornam antigas, antes mesmo de se consolidar. Tudo o que é sólido se evapora no ar, tudo o que era sagrado é profano, e por fim o homem é obrigado a encarar com serenidade suas verdadeiras condições de vida e suas relações como espécie. A necessidade de um mercado constantemente em expansão impele a burguesia a invadir todo o globo. Necessita estabelecer-se em toda a parte, explorar em toda a parte, criar vínculos em toda a parte.(6)
Neste texto, como em outros, Marx e Engels expõem o caráter contraditório das relações sociais capitalistas que engendram, ao mesmo tempo, elementos civilizatórios e progressistas e elementos de destruição, violência e exclusão. Trata-se de um processo que enfrenta, por isso mesmo, crises cíclicas cada vez mais profundas.
A forma que assume a globalização neste fim-de-século tem uma especificidade que é, em sua essência, o desbloqueio dos limites sociais impostos ao capital pelas políticas do Estado de bem-estar social. É, também, nesse sentido, uma revanche contra as conquistas sociais da classe trabalhadora. O ideário da globalização, em sua aparente neutralidade, cumpre um papel ideológico de encobrir os processos de dominação e de desregulamentação do capital e, como conseqüência, a extraordinária ampliação do desemprego estrutural, trabalho precário e aumento da exclusão social. Processo este que, como nos mostra Viviane Forrester(7) produz um quadro de "horror econômico e social". Trata-se, sob este aspecto, fundamentalmente, como nos mostra Cardoso(8) de uma noção ideológica .
O balanço que fazem inúmeros trabalhos de longo alcance histórico e filosófico não nos permite vislumbrar saídas fáceis no fim deste milênio e início do novo para a crise do capitalismo hoje existente. O breve século XX que se desenvolve entre duas sangrentas guerras mundiais, visto sob a ótica da crise,(9) ou o longo século XX, visto sob a ótica dos longos ciclos do capital,(10) marcou, também, na sua última metade, a Era de Ouro do capitalismo.
A crise do capitalismo que vivenciamos seria igual a tantas outras e, portanto, logo adiante voltaríamos a uma nova Era de Ouro, agora sob os auspícios da globalização? O autor que acabamos de citar não aposta nessa direção e conclui que não podemos continuar dentro da lógica nem do passado e nem do presente do capitalismo, por ser este um sistema para o qual "os seres humanos não foram eficientemente projetados". Assim como a "Era de Ouro" não atingiu de forma simétrica a todos, reduzindo-se, pelo contrário, a um grupo pequeno de nações no mundo, a globalização não significa maior equalização como insinua a ideologia dominante. Ao contrário, amplia-se a desigualdade entre Norte e Sul. Arrighi(11) fala-nos, neste contexto, da ilusão do desenvolvimento dos países periféricos.
O filósofo Istvan Mészáros,(12) em sua obra de maior relevância - Beyond Capital (1996) - aponta-nos uma questão mais radical sobre o momento histórico que vivemos. Contrariando as teses da supremacia das relações capitalistas e da via única, defende a tese do esgotamento da dimensão civilizatória do capital, explicitando-se, agora, apenas na sua face destrutiva. O ímpeto de destruição, até mesmo nos países que atingiram grande estabilidade social, tende a aumentar. Os problemas enfrentados atualmente pela França, Alemanha, Itália, entre outros países europeus que tiveram enormes conquistas sociais neste século, elucidam a tese de Mészáros. De acordo com Boaventura Santos,(13) há hoje na Europa 18 milhões de desempregados e 52 milhões de pessoas que vivem no limiar da pobreza. Numa densa resenha Daniel Singer sintetiza-nos a tese de Mészáros.
Na verdade, já há algum tempo o capitalismo perdeu a sua função "civilizatória" enquanto organizador impiedoso mas eficiente do trabalho. (...) Simplesmente para prosseguir existindo o sistema funda-se cada vez mais no desperdício, na "obsolescência planejada", na produção de armas e no desenvolvimento do complexo militar. Ao mesmo tempo, o seu impulso incontrolável para a expansão já produziu efeitos catastróficos para os recursos naturais e o meio ambiente. Nada disso impede ao sistema de produzir "trabalho supérfluo", vale dizer desemprego em massa. Além disso, como para frisar a gravidade de sua crise atual, nos últimos vinte anos o capitalismo vem abolindo todas aquelas concessões que, sob o genérico nome de Estado de Bem-Estar, supostamente justificavam a sua existência.(14)
Estamos diante, pois, de um processo de globalização com uma velocidade sem precedentes viabilizada por novas tecnologias microeletrônicas, informacionais e energéticas e com formas de exclusão, também sem precedentes, sustentadas pela ideologia e políticas neoliberais. Trata-se de políticas fundamentalmente orientadas para garantir os lucros do capital financeiro, em sua maior parte especulativos. A magnitude dessa especulação pode ser indicada no fato de que para "cada cem dólares que circulam diariamente no globo apenas dois pertencem à economia real" (15). Nesse processo não só o sistema produtivo é secundarizado como, especialmente, vem reduzindo a limitada esfera pública burguesa construída para fazer face à crise do capital e ampliada pelas lutas dos trabalhadores. Minimiza-se, assim, a esfera dos direitos sociais, mediante a delapidação do fundo público.(16)
Contrariamente à ideologia da globalização que instaura o senso comum de que a mundialização do capital favorece a todos, amplia-se e aprofunda-se a contradição entre as possibilidades tecnológicas de satisfazer necessidades básicas e as relações sociais de exclusão. As novas tecnologias aplicadas à produção agrícola, por exemplo, permitem a organismos como a FAO afirmar que há hoje a capacidade de produzir alimentos em abundância para 12 bilhões de pessoas. Isso choca-se brutalmente com uma realidade em que mais de três bilhões, dos seis bilhões de habitantes do planeta, vivem em níveis lamentáveis de subnutrição.(17) Os escritores Hans Peter Martin e Harald Schumann18 caracterizam essa sociedade de final de século com o neologismo – "sociedade 20 por 80". Uma realidade que estendei 20% aos direitos sociais e individuais e exclui deles 80%.
Para entender o significado de um dos aspectos da contradição de uma sociedade, ao mesmo tempo global, desigual, fragmentada e excludente, necessitamos apreender: como se constituiu o que Robert Castel(19) denomina de sociedade salarial e, mais amplamente, Boaventura Santos(20) denomina de sociedade contratual; como esta sociedade está sendo desmontada e quais as conseqüências deste desmonte no plano econômico-social mais amplo. Essas dimensões nos permitem, também, compreender o sentido e a função que assumem as políticas de formação profissional.
A construção da sociedade do trabalho-emprego ou sociedade salarial
A crise estrutural do emprego que vivemos neste final de século é uma das dimensões que podem nos ajudar a entender por que a idéia de que com globalização dos mercados e do capital todos ganham é falsa e cínica. Para que isso seja melhor apreendido é fundamental entender-se por que, especialmente a partir dos anos 30 deste século houve, sob a denominação de regulação fordista ou Estado de bem-estar-social, um enorme esforço de construção de políticas de pleno emprego e de direitos sociais na perspectiva de uma sociedade capitalista integradora.
A revolução burguesa, cuja hegemonia se afirma no século XVIII, representou uma mudança radical frente às relações de produção e trabalho e da própria significação de trabalho. Trata-se de um modo social de produção que tem como exigência intrínseca a propriedade privada dos meios e instrumentos de produção e a existência de trabalhadores, duplamente livres – não escravos ou servos (propriedade de outrem) e não detentores de meios e instrumentos de produção. Ou seja, uma força de trabalho disponível e constrangida indo ao mercado trocar horas de trabalho por seus meios de vida. Há concomitantemente um esforço, no plano simbólico e ideológico, de mudar a visão negativa do tripalium (instrumento de três partes para castigo) – herança da sociedade escravocrata – para uma perspectiva positiva, labor. Essa passagem não se deu de forma linear e simultânea em diferentes formações sociais e nem sem traumas, violência, lutas e revoltas. O caso da sociedade brasileira é o exemplo extremo de abolição tardia do regime escravocrata. Estigma que nos marca até o presente e que transforma nossas elites econômicas e políticas entre as mais truculentas, conservadoras e excludentes.
O ideário liberal conservador de organização societária, por partir de um suposto falso que afirmava a existência de uma "natureza humana" com uma razão, motivação, desejos e egoísmos iguais, tinha no mercado auto-regulado seu ideário fundamental. Por esse pressuposto, imaginava-se que a tendência em todos os planos sociais, mormente o econômico, seria o equilíbrio, a igualdade. Essa visão de uma natureza humana sem história, isolada das relações de poder e de classe, teve como resultado uma profunda desregulação social, revoltas, guerras entre as nações, grupos ou classes sociais. A Europa do final do século XIX expõe a tragédia do desemprego e da miséria, e milhares de seus cidadãos foram obrigados a emigrar para novas terras noutros continentes.
E no século XX, como mostra de forma rigorosa o historiador Eric Hobsbawm(21) no seu livro – A era dos extremos – O curto Século XX (1914- 1989), a tese do mercado auto-regulado explicita sua violência e desintegração social mais crucial. Mas é somente após a I Guerra Mundial e a revolução de 1917 na Rússia que os contingentes de proletários, pobres, desempregados, não integrados, passaram a ser encarados como um problema social, uma gangrena e ameaça à estabilidade social. Na mesma ordem de preocupações situa-se a realidade das nações subdesenvolvidas.
O industrial Henry Ford, nos anos 20 deste século, percebeu que, para que o capitalismo prosperasse, seria necessário criar uma sociedade integrada pela produção e consumo de massa e pelo pleno emprego. A idéia matriz é de que os operários pudessem se tornar clientes. Essa tese, que se estrutura num corpo conceitual, político e cultural sob o nome de fordismo, será assumida pelo capitalismo após a segunda Guerra Mundial. Keynes(22) traduz teórica e politicamente os fundamentos de uma sociedade capitalista que, para sobreviver, necessita regular o mercado por um Estado interventor e planejador. Essa necessidade de regulação do mercado é realçada por Karl Polanyi(23) em 1944 em sua obra A grande trasformação. Ao referir-se ao ideário do mercado auto-regulado seu diagnóstico é inequívoco: "Tal instituição não poderia existir por muito tempo sem aniquilar a substância da vida humana e material da sociedade; teria destruído o homem fisicamente e transformado o seu entorno em selvageria"
Mas é somente após o horror do nazismo e fascismo e da Segunda Guerra Mundial, que se busca criar mecanismos de regulação do mercado nos âmbitos nacional e internacional. Poderíamos dizer, na linha da análise de Mészáros,(24) que a sociedade capitalista busca conter a lógica desordenadora do capital. É neste contexto que surgem os Estados-Nação, com suas moedas e legislação e os organismos internacionais reguladores das relações entre as nações. ONU, OTAN, UNESCO, BID, FMI, BM, OIT,(25) são alguns dos mais importantes organismos que surgem neste contexto. E é a partir deste período que vinga a idéia do Estado de bem-estar social que se materializa pela constituição de uma esfera pública burguesa com um fundo público ampliado e mediante o progressivo controle monopólico, por parte dos Estados nacionais, dos setores estratégicos da economia. Um duplo mecanismo de regular o capital e, portanto, o mercado e a possibilidade efetiva de fazer política econômica e social. Por essa via, diz-nos Hobsbawm,(26) o capitalismo, pelo menos em vinte nações mais desenvolvidas, conheceu a sua idade de ouro.
A constituição de uma sociedade que integra os trabalhadores, como estratégia até de controlá-los, mas também como resultado das lutas dos trabalhadores organizados em sindicatos e partidos, implicou a desmercantilização da reprodução da força-de-trabalho e a constituição de uma esfera pública burguesa. Com efeito, mesmo com profundas desigualdades e níveis diversos entre as nações desenvolvidas e subdesenvolvidas, a educação, a saúde, o transporte, o lazer e cultura, a previdência social e o salário desemprego (em algumas poucas nações) passaram a se constituir em direitos sociais dos trabalhadores. Mediante as lutas dos próprios trabalhadores, o direito ao trabalho e à estabilidade no mesmo também foram se ampliando.
Assim, a sociedade salarial, como a compreende Robert Castel,(27) é aquela em que a maioria, mediante seu emprego, tem sua inserção social relacionada ao local que ocupa na escala salarial. O trabalhador certamente não se torna um proprietário com patrimônio, um capitalista, mas tem garantias de poder prever seu futuro e assegurá-lo dentro de padrões minimamente aceitáveis humanamente. O trabalho não vai se ligar apenas à remuneração de uma tarefa, mas emerge como direito.
Um capitalismo que regula o mercado e o capital não deixa de ser capitalismo e, portanto, não supera a existência das classes sociais e, portanto, da desigualdade social. Mas, na medida em que o emprego é encarado como um direito de integrar-se ao consumo, à vida e ao futuro, firma-se a idéia de que se o mercado privado não oferece emprego, o Estado tem a obrigação de fazê-lo. Esta conquista, nos países centrais, permitiu não só que o futuro fosse mais previsível, mas afirmou a expectativa de um futuro melhor para os filhos da classe trabalhadora. É ainda o historiador Hobsbawm(28) que mostra que as conquistas da classe trabalhadora européia não foram pequenas dos anos 50 aos anos 80 . Cabe enfatizar, todavia, como ele mesmo reconhece no livro A era dos extremos, que esta não foi a realidade dos países periféricos, como o Brasil. Aqui conhecemos estas conquistas marginalmente. O que imperou na América Latina, como avalia Eduardo Galeano,(29) foi o Estado de mal-estar social . De todo modo, as gerações de assalariados dos anos 30 até os anos 80, no Brasil, mesmo sob duas ditaduras e curtos períodos de democracia, puderam programar minimamente seu futuro. Antes do golpe civil-militar de 64, o empregado que atingisse 10 anos de emprego ganhava estabilidade. O custo da demissão era altíssimo.
É este edifício que desmorona neste final de século e com ele surge um tempo de insegurança ou ameaça do desemprego estrutural ascendente e de precarização do emprego. Produz-se, nos assalariados, particularmente nos precarizados e desempregados, um sentimento que o psicólogo Victor Frankel(30) diz ser similar ao dos tuberculosos e dos prisioneiros dos campos de concentração – de uma existência provisória sem prazo. O custo humano deste desmonte segue sendo assimétrico, embora atinja escala mundial.
O desmonte da sociedade-salarial e os cenários visíveis.
O conjunto de determinações que levam à crise a sociedade salarial é complexo para dele se dar conta neste espaço. Todavia, é possível, até onde nosso olhar alcança, vincar sua gênese e determinações fundamentais.
A determinação mais profunda radica-se na própria essência do capital – acumular, concentrar, centralizar e, como conseqüência, excluir concorrentes e explorar a força de trabalho. Os anos de ouro do capitalismo, paradoxalmente, se deram, pela capacidade de enquadrar, conter e disciplinar a lógica destrutiva do mercado auto-regulado e do capital mediante a construção de uma esfera pública capitalista. A globalização dos mercados, de forma assimétrica, e do capital especulativo financeiro, que instauram uma verdadeira desordem mundial, é o epílogo de um processo de resistência do capital à sua regulamentação. Já nos anos 40-50 o capital burla as fronteiras dos Estados-Nação mediante a instalação das multinacionais. Trata-se de empresas filiais das matrizes dos centros hegemônicos do capital que se ramificam no mundo buscando mercados onde a exploração da força-de-trabalho e da própria matéria-prima lhes são vantajosas. Em seguida, anos 60/80, aprofunda-se a liberdade do capital mediante as transnacionais. Trata-se de empresas que transitam acima do controle efetivo das nações e criam seu próprio espaço de poder. A globalização ou mundialização do capital, primordialmente do capital financeiro e especulativo, completa o circuito da perda do poder de as sociedades nacionais controlarem o poder anárquico do capital.(31)
O resultado deste processo é uma falência dos estados nacionais mediante a perda da capacidade de suas moedas - crise fiscal e crescente delapidação do fundo público para honrar ganhos do capital especulativo. As reformas do Estado, sob a tríade desregulamentação/flexibilização, autonomia/descentralização e privatização, são, em verdade, políticas oficiais de desmonte da sociedade-salarial e da limitada estratégia de uma sociedade integradora.
No plano da esfera produtiva, presenciamos um crescente monopólio da ciência e da técnica. Isso permite ao setor produtivo ter crescimento com incremento de capital morto e diminuição de capital vivo – força de trabalho. Isto significa que a retomada do desenvolvimento, dentro de um mercado auto-regulado, vai dar-se ou pode dar-se sem efetivo acréscimo de emprego. Mas o fenômeno mais destrutivo é a hegemonia do capital volátil, especulativo, que em poucos meses desorganiza nações aniquilando suas moedas. A recente desvalorização do real nos meses de janeiro e fevereiro de 1999 é um exemplo emblemático disso. O resultado imediato nos é fornecido pelo Banco Mundial em termos de aumento da miséria. Em dois meses – janeiro e fevereiro de 1999, o Banco Mundial avalia que 10 milhões de brasileiros regrediram ao estado de miséria absoluta. Isso significa, em termos de indicadores internacionais, que estas pessoas dispõem de uma renda de apenas dois dólares por dia para sobreviverem.
O desmanche da sociedade do emprego ou salarial, dentro de uma realidade onde pode haver aumento da produtividade e da expansão econômica sem incrementos proporcionais de emprego, pode ser emblematicamente apreendida pelo debate de dois magnatas da área de computadores: John Gage da "Sun Microsistems", e David Packard, da "Hewlett-Packard" mediados pelo professor Rustum Roy, num seminário que reuniu os governos e empresários mais poderosos do mundo e alguns intelectuais no luxuoso hotel Fairmont, em São Francisco, para marcar a instalação da Fundação Gorbachev.
John Gage referindo-se aos seus empregados declara: "cada qual pode trabalhar conosco quanto tempo quiser, também não precisamos de visto para nosso pessoal do exterior (...) Empregamos nosso pessoal por computador, eles trabalham no computador e também são demitidos por computador."
Dirigindo-se a David Packard diz: "Isso você não consegue tão rapidamente, David?"
David Packard retruca: "De quantos empregados você realmente necessita, John?"
"Seis, talvez oito. Sem eles estaríamos falidos. Quanto ao local do planeta onde eles vivem, isso não importa em absoluto" – responde John
O mediador, prof. Rustum Roy intervém e pergunta: "E quantas pessoas trabalham atualmente para a Sun Systems?"
"São dezesseis mil, mas exceto por uma pequena minoria todos demissíveis em caso de racionalização", responde Gage.(32)
A palavra racionalização é uma espécie de condensador que engendra um poderoso simbolismo e pode ser traduzida por: reengenharia, reestruturação produtiva, flexibilização, desregulamentação, descentralização e autonomia. Como nos mostra Déjours, é a partir da necessidade de racionalização que o receituário empresarial e dos governos neoliberais, monitorados por consultorias especializadas, aconselham: enxugar os quadros, tirar o excesso de gordura, arrumar a casa, passar o aspirador, fazer uma faxina, desoxidar, tirar o tártaro, combater a cirrose ou a ancilose".(33)
Qual é o futuro da sociedade salarial ou do trabalho assalariado dentro desse quadro exposto? Esta, também, não é uma pergunta de resposta fácil. Os indicadores do presente, todavia, são inequívocos. O desemprego é o problema social e político fundamental neste final de século. Para Robert Castel(34) o cenário visível é bastante preocupante. As políticas neoliberais e a hegemonia do capital especulativo de um lado e, de outro, o desenvolvimento produtivo centrado sobre a hipertrofia do capital morto – isto é – ciência e tecnologia, informação como forças de produção, acabam desenhando uma realidade onde encontramos:
- Desestabilização dos trabalhadores estáveis. Essa desestabilização dá-se pela intensidade na exploração e pela permanente ameaça de perda do emprego.
- Instalação da precariedade do emprego mediante a flexibilização do trabalho, trabalho temporário, terceirização, etc.
- Aumento crescente dos sobrantes. Trata-se de contingentes não integrados e não integráveis ao mundo da produção.Essa realidade se apresenta com estatísticas alarmantes: um bilhão e duzentos mil desempregados no mundo; taxas de desemprego que variam de 10% a 22% na Europa. Essa situação é amenizada pela existência de uma sociedade civil forte e de uma tradição histórica que garante, mediante o fundo social, a não-proliferação da indigência.
Estatísticas tão alarmantes se explicitam nos países periféricos da América Latina, África e Ásia. São Paulo, um centro do capital internacional, tem uma taxa de desemprego de 19%. Somente em São Paulo, há 1.700.000 trabalhadores desempregados. As taxas de dezembro da Argentina chagam a 18%. A diferença, nos países periféricos, é que não há nem tradição histórica, nem sociedade civil fortemente organizada e nem fundo público para evitar a miséria e a indigência. Mais grave que isso é que se desmontou, mediante a privatização, a capacidade real de fazer política econômica e social. A cultura de sonegação, o privilégio a empresas, e sobretudo a bancos, de não recolherem impostos favorecidos por uma legislação injusta e, mais a renúncia fiscal, impedem a criação de um fundo social capaz de garantir direitos elementares. Nesse quadro, as políticas que buscam fazer face ao desemprego são no mínimo contraditórias, quando não paliativas.
Boaventura Santos(35) avalia os efeitos das políticas neoliberais como instauradoras do "fascismo social" que se explicita por seis formas fundamentais: o fascismo do apartheid social, do Estado paralelo, fascismo paraestatal, o fascismo contratual, o fascismo da insegurança e, finalmente, o fascismo financeiro.
Todas essas formas de fascismo representam quebra do contrato social que se fundava, em relação ao trabalhador, no emprego, e a um conjunto de garantias e direitos. O neoliberalismo rompe e sepulta essas garantias e direitos. "O projeto neoliberal de transformar o contrato de trabalho num contrato de direito civil como qualquer outro configura uma situação de fascismo contratual. Essa forma de fascismo ocorre hoje freqüentemente na situação de privatização dos serviços públicos, da saúde, segurança social, da eletricidade etc.". (36)
A fragilização do trabalhador é reforçada pelo fascismo da insegurança. Este, como nos mostra Boaventura Santos, se manifesta em "grupos sociais vulnerabilizados pela precariedade do trabalho que manifestam elevados níveis de ansiedade e insegurança quanto ao presente e ao futuro, de modo a fazer baixar o horizonte de expectativas e a criar a disponibilidade para suportar grandes encargos, de modo a obter reduções mínimas dos riscos e da insegurança".(37)
O fascismo contratual e da insegurança configuram um quadro onde, para Boaventura Santos,(38) prosperam a venda de " ilusões de segurança" mediante planos privados de seguros saúde e fundos de pensão privados. Certamente, na mesma linha, podemos perceber ansiedade dos trabalhadores adultos e, dos jovens, mesmo de classe média, para se agarrarem em diferentes cursinhos que lhes prometem "empregabilidade".
A formação técnico-profissional como política de inserção e reinserção dos desempregados
Estamos vivendo um final de século paradoxal. A grande maioria dos governos dos países periféricos se ajustam à reengenharia e à reestruturação produtiva, flexibilizam, desregulamentam e apostam, uma vez mais, no mercado auto-regulado. Ora, como nos ensina o octogenário historiador inglês Eric Hobsbawm, (39) o mercado exclui como o gás carbônico polui. Qual seria, então, o alcance das políticas de inserção e reinserção de desempregados numa economia cuja produtividade aumenta cada vez mais pelo incremento no processo produtivo de capital morto (ciência e tecnologia) e de novos métodos de racionalização e organização do trabalho? Qual o poder da escola, da educação básica (fundamental e média) e, especialmente, do ensino técnico-profissional, enquanto instrumentos efetivos nesse processo de inserção e reinserção face aos limites do desenvolvimento do tipo fordista, por sua destruição das bases materiais da vida, em face da crise estrutural do desemprego?(40)
A magnitude da dificuldade de reverter o quadro do desemprego estrutural deste final de século pode ser percebida no fato de que, no mês de maio de 1999, a poderosa "Comissão Européia"- uma espécie de alto comando da União Européia - tentou pela terceira vez e não conseguiu assinar um pacto para o emprego. Com a memória dos horrores de duas guerras mundiais neste século, a Europa busca compensar a crescente incapacidade de criar novos postos de trabalho mediante um fundo social capaz de minimizar as ameaças de degradação social. Esta, todavia, não é uma tarefa fácil nem mesmo para economias do capitalismo central. Para Robert Castel( 41), os cenários à vista, em relação à crise do desemprego e à crise da sociedade salarial, são complexos e preocupantes. Aponta-nos, este autor, quatro cenários presentes de formas diversas nas diferentes formações sociais capitalistas.
O pior cenário é o de uma radicalização das políticas neoliberais numa crescente mercantilização dos direitos sociais, a ruptura crescente da proteção ao trabalho e a instalação de um mercado auto-regulado. Nesse cenário o número de trabalhadores sobrantes se amplia e suas vidas se precarizam ficando na dependência de planos emergenciais de alívio à pobreza, da filantropia e da caridade social.
O segundo cenário, que não elide o primeiro, adotado pela maioria dos países, é de atacar pelos efeitos. Instauram-se políticas focalizadas de inserção social. As políticas de formação profissional, na perspectivas que vêem assumindo nos anos 90, parecem se enquadrar como parte desse segundo cenário.
O terceiro cenário é a auto-organização dos excluídos mediante uma organização alternativa do trabalho – uma nova cultura do trabalho. Esta realidade vem sendo cunhada com nomes diferentes e com sentidos diversos. Economia solidária é o mais geral. No Brasil, a UNITRABALHO (Rede Interuniversitária de Estudos e Pesquisa sobre Trabalho) tem um comitê que busca efetivar um inventário sobre a economia solidária. Mas também encontramos os conceitos de economia popular, economia de sobrevivência e, mais amplamente, de mercado informal . Há, aqui, questões de várias ordens. A primeira é de diferenciação de perspectivas que engendram estes conceitos. A segunda é de se averiguar qual o alcance global destas alternativas e o que há de romantização ou efetivamente de novo em termos de relações econômicas e cultura do trabalho.
Por fim, um quarto cenário explicita as teses daqueles que já decretam que chegamos à sociedade do conhecimento, sociedade do entretenimento, do lúdico ou do fim do trabalho e a sociedade do tempo livre. De imediato esta tese se choca com a multidão de sobrantes, cujo tempo livre não significa nem entretenimento, nem tempo lúdico, mas tempo torturado de precariedade – existência provisória sem prazo.
Como se situa a questão da escola básica e da formação técnico-profissional neste contexto na visão dos condutores das políticas do ajuste, desregulamentação, descentralização e "autonomia" e da Privatização? Que perspectivas de educação básica e de formação técnico-profissional se tecem historicamente no Brasil numa direção oposta?
No Brasil dos anos 90, tem se efetivado uma alteração profunda do sistema educacional no seu conjunto, especialmente da formação técnico-profissional. A alteração dá-se tanto no plano organizativo, quanto no plano político-pedagógico. A profundidade e as conseqüências funestas dessa alteração somente podem ser entendidas quando as situarmos dentro do projeto societário que vem sendo construído, em nome da globalização, por forças econômicas e políticas que Francisco de Oliveira (42 )denomina de "vanguardas do atraso".
As reformas que se processam no âmbito educativo e especificamente na formação técnico-profissional estão claramente predefinidas como estratégia particular do denominado ajuste estrutural que implica as reformas do Estado no plano político-institucional e no plano econômico-administrativo. O bloco de poder que governa hoje o Brasil, antes mesmo de assumir o governo, como mostra Cunha,(43) tinha um projeto elaborado por especialistas para ser aplicado na sociedade. O caráter minimalista e desregulamentador da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394. de 20.12.96)(44 )se coaduna tanto à estratégia de impor pelo alto um projeto preconcebido, quanto com a tese do Estado mínimo" com a tríade do ajuste estrutural: desregulamentação, descentralização e privatização. Ou seja, como observa Saviani, isso deixa "o caminho livre para a apresentação de reformas pontuais, tópicas, localizadas, traduzidas em medidas como o denominado "Fundo de Valorização do Magistério", os Parâmetros Curriculares Nacionais", a lei de reforma do ensino profissional e técnico. (...).(45)
O resultado desse caráter minimalista é exemplarmente explicitado na nova conformação que assume o ensino técnico-profissional. Desde o momento que o atual governo assumiu, desencadeou-se uma grande bateria de proposições e propostas de regulamentação. O projeto de Lei nº 1603/96(46) contempla esse arsenal de proposições condizentes com o projeto do governo para o ensino técnico-profissional. Este Projeto de Lei esbarrou com a disputa dos educadores, especialmente os vinculados ao Sistema Federal do Ensino Técnico Industrial, que postulavam alterações na direção da concepção de um ensino técnico unitário, tecnológico ou politécnico e de caráter público. A aprovação da LDB minimalista aliviou o executivo desta pressão e, imediatamente, retirou o referido PL e o transformou, autocraticamente, em Decreto nº 2208 de 17.04.97,(47) impondo a reforma que desde o início postulava.
O Decreto nº 2.208/97(48) representa uma regressão ao dualismo e exacerbação da fragmentação. O dualismo se cristaliza pela separação das dimensões técnicas e políticas, específicas e gerais, particulares e universais e pela separação do nível médio regular de ensino da rede não regular de ensino técnico-profissional com organização curricular específica e modular. Esta rede não-regular de formação técnico-profissional se estrutura em três níveis:
O nível básico para a massa de trabalhadores, jovens e adultos, independentemente da escolarização anterior, mas certamente igual ou inferior ao ensino fundamental, que tem o objetivo de "qualificar, requalificar ou reprofissionalizar". Este nível abre espaço de intensa atuação para o atual Sistema S e define um novo papel das Escolas Técnicas Federais, o que caracteriza aquilo que Cunha(49) denominou de senaização das Escolas Técnicas Federais. Além disso, é um terreno aberto para quem queira disputar os recursos públicos do FAT (Fundo de Assistência do Trabalhador). Trata-se de cursos que não estão sujeitos à regulamentação curricular.
O nível técnico, com uma organização curricular independente destinado a matriculados ou egressos do ensino médio. Aqui situa-se a pressão e a direção para onde quer se encurralar o Sistema de Escolas Técnicas Federais. Trata-se de "flexibilizar seus currículos" adaptando-os às "competências" demandadas pelo mercado. Trata-se de um currículo modular, fundado na perspectiva das habilidades básicas e específicas de conhecimentos, atitudes e de gestão da qualidade, construtoras de competências polivalentes e, supostamente, geradoras da empregabilidade. Módulos que podem ser compostos em diferentes instituições públicas ou privadas. Subjacente a essa mudança e em consonância com as diretrizes do Banco Mundial, situa-se a estratégia de transformar esse tipo de ensino num serviço a ser oferecido para o financiamento tanto do setor privado empresarial quanto do setor público. Vale dizer, um mecanismo claro de privatização.
A política do governo do Estado de Minas Gerais (período de 1995-1998), apresentado como modelo de adaptação aos padrões da qualidade total sob os auspícios do financiamento e da orientação político-pedagógica do Banco Mundial, em relação ao ensino técnico-profissional, antecipa uma possível tendência da privatização. Com efeito, criou os CREPs (Centros de Educação Profissional), de modalidade diversa, de acordo com a especificidade econômica regional, construídos com o fundo público e entregues para a gestão da iniciativa privada.(50) Essa medida, além de profundamente antidemocrática, por engendrar um pressuposto de uma educação e formação profissional restrita e localista, choca-se com o ideário da necessidade de formar um profissional polivalente e capaz de "integrar-se" ao mercado global e reestruturação produtiva.
Por fim, o nível tecnológico, destinado a egressos do ensino médio e técnico, para a formação de tecnólogos em nível superior em diferentes especialidades.
O deslocamento do sistema de ensino técnico industrial do âmbito do ensino regular e sua senaização permite ao governo, ao setor empresarial e grupos ou Departamentos Regionais do Sistema S encamparem a tese de diminuição do custo Brasil e, portanto, a revogação do recolhimento do imposto compulsório. Frente a esta possível ameaça para o futuro, o Senai passou a adotar uma estratégia de gestão, baseada em Unidades de Negócios, vendendo serviços segundo as demandas dos setores privados e público. O que se apresentava como uma tendência no início dos anos 90, é hoje uma realidade no Senai e, em menor escala e intensidade, começa a contagiar também alguns Departamentos Regionais do Senac. Na conclusão, assinalaremos algumas implicações e conseqüências em termos sociais deste encaminhamento.
Mediante essas reformas, a educação regular e, especialmente, a formação técnico-profissional aparecem, uma vez mais, como sendo a "galinha dos ovos de ouro" que pode nos ajustar à nova ordem mundial definida pela globalização e reestruturação produtiva. A novidade, diferente da perspectiva ideológica da teoria do capital humano dos anos 60/70 é que o objetivo não é de integrar a todos, mas apenas aqueles que adquirirem "habilidades básicas" que geram "competências" reconhecidas pelo mercado. Competências e habilidades para garantir não mais o posto de trabalho e ascensão numa determinada carreira, mas da empregabilidade. O ideário das novas habilidades – de conhecimento, de valores e de gestão, – e, portanto, de novas competências para a empregabilidade apagam o horizonte da educação e formação técnico-profissional como um direito subjetivo de todos. Trata-se, agora, de serviços ou bens a serem adquiridos para competir no mercado produtivo – uma perspectiva educativa produtivista, mercadológica, pragmática e, portanto, desintegradora.
A educação e a formação para a "empregabilidade" seriam a chave mágica para superar a crise do desemprego estrutural e do desmonte da sociedade salarial?
No plano da mistificação, a idéia que se passa é de que o "fim do emprego" é algo positivo para a competitividade e de que, em realidade, com isso, todos ganham. Esse senso comum é partilhado não só pela "literatura de aeroporto", mas por planos de governos neoliberais, ONGs e de instituições ligadas ao sistema educacional e à formação profissional. Nos planos governamentais, as noções de flexibilização e desregulamentação mascaram o jargão mais tosco dos receituários dos consultores de "recursos humanos", para fundamentar o deslocamento da responsabilidade social com o emprego e instaurar o que Boaventura Santos denominou de "fascismo contratual e fascismo da insegurança". Nos pareceres e diretrizes da educação e formação profissional, a dissimulação é ainda mais rebuscada. Os argumentos para uma perspectiva individualista de educação e de formação técnico-profissional estruturada a partir de um "banco ou carteira" de habilidades e competências se baseia tanto em argumentos de que vivemos numa sociedade em rápidas mudanças, quanto em argumentos fundados na ideologia do pós-modernismo que realçam as diferenças (individuais) e a alteridade. Neste particular, a diferença e a diversidade mascaram a violência social da desigualdade.
O texto que segue sintetiza o senso comum que se tem instaurado em relação à noção de empregabilidade e evidencia o seu elevado grau de mistificação.
"A empregabilidade é um conceito mais rico do que a simples busca ou mesmo a certeza de emprego. Ela é o conjunto de competências que você comprovadamente possui ou pode desenvolver – dentro ou fora da empresa. É a condição de se sentir vivo, capaz, produtivo. Ela diz respeito a você como indivíduo e não mais à situação, boa ou ruim da empresa – ou do país. É o oposto ao antigo sonho da relação vitalícia com a empresa. Hoje, a única relação vitalícia deve ser com o conteúdo do que você sabe e pode fazer. O melhor que uma empresa pode propor é o seguinte: vamos fazer este trabalho juntos e que ele seja bom para os dois enquanto dure; o rompimento pode se dar por motivos alheios à nossa vontade. (...) (empregabilidade) é como a segurança agora se chama (Grifos meus).(51)
As noções de empregabilidade, trabalhabilidade ou laborabilidade, que buscam positivar a situação de desmonte da sociedade salarial, quando confrontadas com a realidade não apenas evidenciam seu caráter mistificador mas, sobretudo, revelam também um elevado grau de cinismo. Com efeito, para o contingente de pessoas – mais de um bilhão no mundo – que, como nos lembra Forrester,(52) tem como emprego ou ocupação, de todos os dias da semana, todas as semanas do mês e de todos os meses do ano, a procura de um emprego, essas noções não evidenciam uma realidade humanamente promissora.
"(...) uma bela palavra soa nova e parece prometida a um belo futuro: "empregabilidade, que se revela como um parente muito próximo da flexibilidade, e até como uma de suas formas. Trata-se, para o assalariado, de estar disponível para todas as mudanças, todos os caprichos do destino, no caso dos empregadores. Ele deverá estar pronto para trocar constantemente de trabalho (como se troca de camisa, diria a ama Beppa). Mas, contra a certeza de ser jogado "de um emprego a outro", ele terá uma "garantia razoável", que dizer, nenhuma garantia de encontrar emprego diferente do anterior que foi perdido, mas que paga igual".(53)
Essas noções, tão em voga hoje nas diretrizes governamentais de educação básica, média, superior e na formação profissional, talvez mais nos dificultem que ajudem a enfrentar o desafio de buscar alternativas de construção de uma sociedade democrática comprometida em assegurar os direitos de educação, saúde, habitação, transporte, lazer, cultura, emprego e seguridade social. Também não serão, certamente, noções mágicas que darão às instituições de formação profissional a base para suas políticas presentes e futuras.
Considerações Finais
O historiador Eric Hobsbawm, (54) no último parágrafo do livro Era dos Extremos nos diz que não sabemos para onde vamos, mas sabemos o que nos trouxe até aqui e que, se continuarmos os rumos do passado e do presente para o novo milênio, vamos fracassar. E o preço desse fracasso será a escuridão. O rumo a reforçar não é, pois, do ajuste subordinado à globalização e reestruturação produtiva que produzem uma sociedade da exclusão e de desintegração social. Também a direção a reforçar não é de uma reforma estrutural calcada no ideário neoliberal do Estado mínimo (em suas funções de atendimento aos direitos sociais) e, portanto, na estratégia da desregulamentação, descentralização e privatização. Como nos indica Tarso Genro, necessitamos de uma reforma de Estado oposta à que está em curso.
" Trata-se de compartilhar uma nova concepção de reforma do Estado, a partir de uma nova relação Estado-Sociedade que abra o Estado às organizações sociais (e à participação do cidadão isolado), particularmente aquelas que são auto-organizadas pelos excluídos de todas as matizes, admitindo a tensão política como método decisório e dissolvendo o autoritarismo do estado tradicional sob pressão da sociedade organizada." (55)
O projeto de sociedade brasileira a construir implica, como vêm apontando inúmeros estudos, uma opção de vinculação com o mundo, mas de forma soberana. Essa soberania somente é possível de ser construída, como aponta Genro, com a efetiva participação da sociedade. Não se trata de partir de um ponto zero. A história brasileira não se reduz à história dos grupos conservadores. Celso Furtado , num pequeno e denso livro de traço biográfico - O Capitalismo global (1999) - recupera os fundamentos de um projeto de desenvolvimento balizado nos objetivos estratégicos de preservação do patrimônio natural e o "pleno" desenvolvimento dos seres humanos concebidos como um fim, portadores de valores inalienáveis". (56 )As condições prévias de viabilidade desse projeto passam por um conjunto de decisões dentre as quais se destacam: uma nova postura em face da dívida externa, que é econômica, social, ética e politicamente impagável; uma ampla desconcentração e democratização da renda (uma das mais desiguais do mundo hoje); ampliação e proteção do mercado interno objetivando a criação de empregos; uma efetiva reforma agrária; impostos progressivos e estancamento da sonegação fiscal e dos mecanismos antidemocráticos de renúncia fiscal; taxação das grandes fortunas; maciço investimento em educação, ciência e tecnologia, etc. Essas medidas apontam para a necessidade de ampliar de forma substantiva o fundo público e a criação de mecanismos de seu controle democrático.
A imensa dívida social, em termos de atendimento dos direitos elementares da população brasileira dentro de uma esfera pública, pode ser elucidada comparativamente pela porcentagem do PIB que compõe o fundo público de alguns países. Entre os anos 80 e 95, a Inglaterra, berço do neoliberalismo, aumentou a proporção do fundo público de 34% para 36% do PIB, a França de 46% para 54%, a Itália de 42% para 54%, a Suécia, de 61% para 70%. Em sentido inverso, Brasil e Argentina, que seguem as cartilhas neoliberais do ajuste e a tese do Estado mínimo, tinham, aproximadamente, em 1980, uma proporção do PIB no fundo público de 35% e, que, em 1995 caiu para aproximadamente 28%.(57)
Esses números são eloqüentes para nos mostrar que a lógica do ajuste estrutural, particularmente ao capital especulativo, que efetiva uma sangria do fundo público e inviabiliza o atendimento dos direitos elementares dos cidadãos e, de outro lado, que a tese da diminuição do "custo Brasil" são decorrência de uma mentalidade e cultura histórica das elites do atraso. Ao contrário de nos levar competitivamente ao nível das nações que investem nas atividades cerebrais – produção de conhecimento básico e aplicado – e que se traduzem por um equilibro de uma maior igualdade social, passamos a servir de modelos de desintegração social e de aviltamento das condições de trabalho e de vida.(58) O sociólogo Ulrich Beck,(59) em seu livro Admirável mundo novo do trabalho, utiliza a expressão "brasilização do Ocidente" para referir-se à tendência de precarização do trabalho e condições de vida no mundo desenvolvido.
A educação escolar básica – ensino fundamental e médio – e superior tem uma função estratégica central dentro da construção do projeto alternativo de desenvolvimento acima aludido. Trata-se, primeiramente, de concebê-la como direito subjetivo de todos e o espaço social de organização, produção e apropriação dos conhecimentos mais avançados produzidos pela humanidade. Isso significa, como indica Antônio Nóvoa, que a função precípua da escola básica é de dar a base de conhecimentos, valores e "estimular as crianças a aprenderem a estudar e pensar e também a aprender a se comunicar e viver em conjunto (...) As democracias dependem da cidadania ativa e consciência clara das nossas responsabilidades sociais. A escola é a melhor instituição que pode cumprir esta tarefa, talvez a única". (60)
Isso, de imediato, nos indica que a melhor preparação para a vida, para a cidadania ativa, para a democracia e para o direito ao trabalho moderno é uma educação básica não produtivista e pragmática. Isso significa que é uma postura duplamente equivocada atrelar a escola básica (fundamental e média) ao imediatismo do mercado de trabalho e à ideologia das competências para a famigerada "empregabilidade" ou "laborabilidade". Trata-se de noções ideológicas que não engendram densidade histórica. Primeiramente, porque, se é básica, refere-se a todas as dimensões da vida humana e não unidimensionalmente ao mercado. Em segundo lugar, porque a relação do conhecimento básico com o mundo da produção é mediatizada pelas relações sociais.
Em relação à formação técnico-profissional, os embates sobre a origem do Senac e do Senai, nos indicam que essas instituições se estruturaram dentro da perspectiva fordista de um projeto de construção da sociedade do trabalho-emprego, da sociedade salarial e, portanto, numa perspectiva societária integradora, ainda que nos marcos restritos do capitalismo. Esta formação, sem dúvida, está mais diretamente ligada ao mundo da produção e ao mercado de trabalho. Sua efetividade social integradora, todavia, está condicionada fundamentalmente a dois pré-requisitos. Primeiramente, à existência de uma escolaridade básica de qualidade, entendida aqui numa dimensão não mercadológica, mas social. A segunda condição fundamental para não mistificar o papel da formação profissional é, inequivocamente, a existência de uma política econômica centrada na geração de emprego e com mecanismos de distribuição justa da renda nacional.
O deslocamento que a formação técnico-profissional vem sofrendo dentro do projeto de ajuste da economia brasileira à nova (des)ordem mundial parece situar-se em dois pólos, ambos, a nosso ver, pouco democráticos. A de constituir-se numa filantropia ou de elitizar-se numa perspectiva de uma sociedade desintegrada, hipertrofiando as dimensões individualistas e particularistas. Assume, assim dominantemente, uma função de intervenção focalizada cujo resultado é de tratar as conseqüências.(61) A política do PLANFOR (Plano Nacional de Educação Profissional) com recursos do FAT, elucida com clareza inequívoca o que acabamos de afirmar. O risco do PLANFOR é de reeditar o PIPMO (Programa Intensivo de Preparação de Mão-de-Obra) que, como nos mostra Barradas,(62) de programa emergencial de preparação intensiva de mão-de-obra que deveria durar 20 meses, acabou durando 20 anos.
As iniciativas de cursos do PLANFOR são tão diversas que intervenções focalizadas se materializam por uma dispersão sem limites. Os cursos podem ser para emitir passagens, fazer velas ou aquilo que uma revista de uma seita religiosa indica como solução para o desemprego – treinar os desempregados para oferecer serviços de catar piolho, cuidar de cachorros, catar minhocas – cursos que se centram em tecnologias de última geração ou a perspectivas mais amplas vinculadas aos interesses dos trabalhadores, como é o caso do projeto INTEGRAR. Mesmo neste último caso seus dirigentes sabem que, por si mesmos, esses cursos não têm a capacidade de criar emprego.
Vincular a política de formação profissional a um projeto de desenvolvimento centrado nas necessidades da população brasileira significa, ao contrário da perspectiva de transformar as instituições de formação profissional em unidades privadas de negócio, a necessidade de dilatar sua função pública. Com efeito, a breve análise que empreendemos nos evidencia que a tese de diminuição do Custo Brasil e a perspectiva de, em nome disto, acabar como o imposto compulsório e transformar o sistema de formação profissional em unidades de negócios é anacrônica e antidemocrática. Com isso se estaria reforçando a perspectiva de uma sociedade desintegradora e cada vez mais elitista. Isso porque o fim do compulsório significa, simplesmente, para instituições como o Senac e o Senai, o fim do sistema nacional e o isolamento de unidades fragmentadas. E pelo que conhecemos da realidade brasileira, 80% dos Departamentos Regionais encolheriam enormemente, deixando de atender milhares de jovens e adultos.
Outra conseqüência imediata é de que essas instituições passariam a cumprir o longo decálogo do "passar o aspirador", enxugar os quadros, tirar as gorduras, etc., demitindo milhares de trabalhadores. O exemplo da Fundação Getúlio Vargas e, em parte, do processo de "modernização" do Senai é claro neste sentido. A Fundação Getúlio Vargas (RJ), transformou-se na "era Collor" "numa unidade de negócio", de venda de serviços gerenciais, uma espécie de um cartório, fechando, mediante uma simples portaria, nove Institutos ligados à área social.
Esses casos colocam uma ulterior questão que ainda não é percebida de forma vigorosa na sociedade, mas que, em espaços mais democráticos, tem surgido. Trata-se de argüir-se a legitimidade de pequenos grupos – uma minoria – apropriar-se da marca, do acúmulo de conhecimentos e do patrimônio de 50 anos construído com fundo público pela nação brasileira e geri-los na venda de serviços – agora estritamente como negócio privado. Governos futuros que possam ir além da fraca democracia formal que temos hoje certamente não permitirão essa apropriação eticamente insustentável.
A direção da análise que empreendemos neste breve artigo nos indica que, se o nosso objetivo é dilatar as possibilidades de construção de um projeto de sociedade com democracia efetiva no plano econômico, social, cultural e educacional, e construir uma sociedade cujo ideário não seja a "exclusão sem culpa", o rumo que devem seguir a política e as instituições de formação técnico-profissional é de ampliar a sua função social e não de restringi-la. Nessa direção, o espaço do Sistema de formação profissional é o de institucionalmente empenhar-se na construção de uma proposta pedagógica capaz de adaptar-se à diversidade de situações de diferentes grupos de jovens e adultos que demandam essa formação específica. Isto implica, de outra parte, como insistimos acima, em ampliar o fundo público com controle democrático e não reduzi-lo.
Na tarefa de construirmos esta alternativa societária torna-se imperativa uma boa dose de utopia, pois sem esta não há educação e nem futuro humano. A utopia é uma tensão permanente daquilo que é posto como medida final, como imutável. É para isso que serve a utopia. A utopia é que nos ajuda a afirmar os princípios da igualdade, solidariedade e a gene-rosidade humana.
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Notas
1 RODRIGUES, J. O moderno Príncipe Industrial: o pensamento pedagógico da Confederação Nacional da Indústria. Campinas: Ed. Autores Associados, 1998.
2 SAVANI, D. A nova lei da educação: LDB, trajetória, limites e perspectivas. Campinas/SP: Autores Associados, 1997.
3 CASTEL, R. As armadilhas da exclusão. In: CASTEL, R, WANDERLEY, L.W, WANDERLEY, M.: A desigualdade e a questão social. São Paulo: EDUC, 1997.
4 Como a noção de empregabilidade engendra a memória do emprego e, como mostra Castel (1977) op. cit., o mesmo denota mais que uma tarefa, mas um conjunto de direitos que permite aos assalariados, mesmo em circunstâncias precárias e desiguais, programarem seu futuro, os mentores das políticas oficiais de formação profissional , em nível de Ministério do Trabalho e das políticas de educação regular do MEC, para esvaziarem a crítica àquela noção, a metamorfosearam com as noções de trabalhabilidade ou laborabilidade.
5 O debate sobre o processo de globalização é amplo e polêmico. Alguns autores, como por exemplo CHESNAIS, F. Mundialização do capital. Petrópolis-RJ: Vozes, 1997, utilizam o conceito de "mundialização do capital". O leitor interessado em aprofundar o debate sobre globalização ver: HIRTS, Paul. Globalização: mito ou realidade? In: FIORI, José Luiz (org.) et ali. Globalização: o fato e o mito Rio de Janeiro: UERJ, 1999. p. 101-145; CARDOSO, M. L. A ideologia da globalização e descaminhos da ciência social. Rio de Janeiro, [s.n.] 1997. mimeo; IANNI, O. Teorias da globalização. 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996; FURTADO, C. O Capitalismo global. São Paulo: Paz e Terra., 1999; DOS SANTOS, T. Economia mundial. Petrópolis-RJ: Vozes, 1993; DREIFUSS, R. A. A época das perplexidades: mundialização, globalização e planetarização - novos desafios. Petrópolis-RJ: Vozes, 1996; MARTIN, H. P., SCHUMANN, H. A armadilha da globalização: o assalto à democracia e ao bem-estar .São Paulo: Ed. Globo, 1996.
6 MARX, K , ENGELS, F. O Manifesto Comunista. Apud. LASKI, H.J. O Manifesto Comunista de Marx e Engels. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
7 FORRESTER, V. O horror econômico. São Paulo: UNESP, 1996.
8 CARDOSO, M. L. A ideologia da globalização e descaminhos da ciência social. Rio de Janeiro, [ s. n.] 1997. mimeo.
9 HOBSBAWM, Eric. A era dos extremos: o curto século XX (1914-1989). São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
10 ARRIGHI, G. O longo século XX. São Paulo: UNESP, 1966.
11 Id. A ilusão do desenvolvimento. Rio de Janeiro: Vozes, 1998. p. 207-250
12 MÉSZÁROS, I .B. Beyond capital: towards a theory of transition.[s.l.] Merlin Press, 1996. 994p.
13 SANTOS, Boaventura de Souza. Reinventar a democracia: entre o pré-contratualismo e o pós-contratualismo. In: HELLER, A. , SANTOS, Boaventura de Souza; CHESNAIS, F. et ali . A crise dos paradigmas em Ciências Sociais e os desafios para o século XXI. Rio de Janeiro: Contraponto-CORECON-RJ, 1999. p. 31- 75 .
14 SINGER, D. Para além da alienação. Journal The Nation, Nova York, 10.06.1996.
15 SANTOS, Boaventura de Souza. op. cit., p. 55.
16 OLIVEIRA, Francisco de. Os direitos do antivalor. Petropólis:: Vozes, 1998. O surgimento do antivalor: capital, força de trabalho e fundo público.
17 DEBRAY, R., ZIEGLER, J. Trata-se de não entregar os pontos. São Paulo: Paz e Terra, 1995.
18 MARTIN, H. P., SCHUMANN, H. A armadilha da globalização: o assalto à democracia e ao bem-estar. São Paulo: Globo, 1996.
19 CASTEL, R. op. cit.
20 SANTOS, Boaventura de Souza. op. cit.
21 HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX. 1914-1991. São Paulo: Cia das Letras, 1995. p. 391-562.
22 KEYNES, J.M. The general theory of employment , interest end money. New York: McMillan, 1970.
23 POLANYI, K. The great transformation. Boston , [s.n.] 1957.
24 MÉSZÁROS, I. B. op. cit.
25 ONU (Organização das Nações Unidas), OTAN ( Organização do Tratado do Atlântico Norte), UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação Ciência e Cultura); BID ( Banco Interamericano de Desenvolvimento); BM (Banco Mundial); FMI (Fundo Monetário Internacional); OIT ( Organização Internacional do Trabalho).
26 HOBSBAWM, Eric. op. cit.
27 CASTEL, R. op. cit.
28 HOBSBAWM, Eric. Adeus a tudo aquilo. In: BLACKBURN, R. Depois da queda: o fracasso do comunismo e o futuro do socialismo. São Paulo: Paz e Terra. 1992. p. 93-106
29 GALEANO, Eduardo. As veias abertas da América Latina. 14. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
30 FRANKEL, V. (1944) Apud BEJZMAN, I. Degradação. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 06 ago., 1997. Caderno Informe p. 3.
31 A liberdade anárquica do capital especialmente na sua forma hegemônica - capital financeiro - longe de apresentar uma situação de saúde da sociedade capitalista, é sintoma de grave doença e crise. Como nos indica Oliveira op. cit., uma literatura ousada mostra que a perda do controle do capital financeiro especulativo está pondo em risco um dos fundamentos basilares da sociedade capitalista, a propriedade privada. O especulador causa enormes estragos a inúmeras empresas e pessoas, porém dificilmente é, dentro do direito positivo atual, passível de ser levado a juízo por danos e perdas.
32 MARTIN, H. P. , SCHUMANN, H. op. cit.
33 DEJOURS, C. A banalização da injustiça social. Rio de Janeiro: FGV, 1999.
34 CASTEL, R. op. cit.
35 SANTOS, Boaventura de Souza. op. cit.
36 Id. ibid., p. 33.
37 Id. ibid., p. 54-55.
38 Id. ibid.
39 HOBSBAWM, Eric. Renascendo das cinzas. In: BLACKBURN, R. Depois da queda: o fracasso do comunismo e o futuro do socialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992. p. 255-270.
40 Para uma discussão mais detalhada desta questão ver FRIGOTTO, G. (Org.) et alii Educação e crise do trabalho: perspectivas de final de século. 2 ed. Petrópolis-RJ: Vozes, 1998.
41 CASTEL, R. op. cit.
42 OLIVEIRA, Francisco de. As mudanças na esfera econômica , hegemonia política e as alternativas democráticas do Brasil nos anos 90. [s.l: s.ed.] Manaus, 01. 10. 1997 (conferência)
43 CUNHA, L. A. Educação Brasileira: projetos em disputa. São Paulo: Cortez, 1995.
44 BRASIL. Leis, Decretos. Lei n. 9.394, de 23 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional .Diário Oficial [da]República Federativa do Brasil, Brasília, v. 134, n. 248, p. 27833-27841, 23 dez. 1987. Seção I.
45 SAVIANI, D. op. cit.
46 BRASIL. Leis, Decretos. Projeto de Lei n. 1.603, de 18 de março de 1996. Dispõe sobre a educação profissional, a organização da rede federal de educação profissional, e dá outras providências. Diário da Câmara dos Deputados, Brasília, 03 de abril de 1996. p. 8534. Seção 1. Apresentado pelo Poder Executivo.
47 BRASIL. Leis, Decretos. Decreto n. 2.208, de 17 de abril de 1997. Regulamenta o parágrafo 2 do art. 36 e os art. 30 a 42 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, v. 135, n. 74 , p. 7760-7761, 18 abr. 1997. Seção 1.
48 Id. ibid.
49 CUNHA , L. A . Conferência proferida como pré-requisito do concurso de professor titular na Universidade
Federal do Rio de Janeiro/ UEFERJ, 1997.
50 Informações colhidas do prof. João Batista Viana, em texto mimeografado que por ele me foi enviado para inteirar-me das tendências que vem assumindo a formação técnico-profissional no Estado de Minas Gerais. Belo Horizonte, 07.11.1997.
51 MORAES, C. Emprego ou empregabilidade. Revista Ícaro Brasil, n. 171, 1998. p.53-57.
52 FORRESTER, V. O horror econômico. São Paulo: UNESP, 1996.
53 Id. ibid., p. 118.
54 HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos. op. cit.
55 GENRO, T. Vinte e uma 21 teses para a criação de uma política democrática e socialista. Folha de São Paulo, São Paulo, 09, jun., 1996.
56 FURTADO, C. O Capitalismo global. São Paulo: Paz e Terra, 1999.
57 Dados da OCDE fornecidos pelo Professor Atílio Boron -UBA-AR, em 29.10.1997, em conferência proferida na UFF-RJ.
58 Para se ter uma idéia da distância que nos encontramos em relação ao mundo desenvolvido, no âmbito do investimento na educação básica, os dados que indicamos a seguir são eloqüentes. Tomando-se dados oficias do governo e o sentido não claramente manifesto do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério, percebe-se a fragilidade do investimento educacional em nosso país. O patamar para referência é de 314 reais aluno/ano. O relatório "Futuro em Risco", patrocinado pela Inter-American Dialogue e pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento, que trata da crise da educação na América Latina e as conseqüências na estagnação econômica, mostra-nos que o grau médio de gasto aluno/ano para o ensino fundamental e médio, nos países desenvolvidos, é de 4.170 dólares. Um dado bastante insólito, mas elucidativo, colhido num debate realizado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, foi-me apresentado por um vereador da cidade de Natal. Nessa capital, o custo médio aluno/ano na escola pública era de 444 reais e o custo para manter um preso na cadeia pública era de 444 reais/mês.
59 BECK, U. Entrevista. Folha de São Paulo, São Paulo, 23, maio, 1999. Caderno Mais.
60 NÓVOA, A. Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 13, jun., 1999. Caderno Empregos e Educação para o Trabalho.
61 Para uma avaliação do PLANFOR ver: UNITRABALHO - Avaliação do PLANFOR: uma política pública de educação profissional em debate. Cadernos UNITRABALHO, 2. São Paulo, 1999.
62 BARRADAS, A. da Silva. A Fábrica Pipmo. Rio de Janeiro: FGV, 1986. ( Dissertação de Mestrado).